segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Video - Festival Pedra Rachada 2010





Filmagem e Edição: Jocelyn
www.TresNarizesProducoes.com.br

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Primeira repetição mineira da via Place of Happiness na Pedra Riscada

Essa semana na Rokaz tem quatro escaladores tão alegres que eles estão rindo a toa o tempo inteiro, qualquer coisa que acontece agora não importa, eles acabaram de viver uma aventura fantástica e eles são profundamente felizes...

Essa aventura foi a escalada de uma das vias de paredão mais incríveis do mundo, a via "Place of Happiness", na Pedra Riscada (São José do Divino - MG).
Depois de uma primeira tentativa em Junho, decidimos voltar a tentar essa via, não porque nosso orgulho estava ferido, mas porque a via merece muito provavelmente o título de via de big wall mais linda do Brasil...

A empreitada foi muito árdua, a estratégia inicial não deu certo, a escalada aconteceu de um jeito totalmente diferente do que tínhamos imaginado, arrumamos a maior gambiarra que ja arrumei da minha vida num paredão, passamos muito aperto e foi por isso que estamos tão felizes agora. O escalador de paredão, ou o montanhista em geral, é um cara as vezes um pouco esquisito: quanto mais aperto ele passa, mais feliz ele fica depois!
O graal do escalador é seu limite: ele fica a vida inteira procurando ele, nos boulders, nas esportivas ou nos paredões, e cada vez que ele consegue superar seu limite, ele atinge o nirvana.
E na Pedra riscada, superamos nossos limites...


Os quatro caras felizes da vida: Alexis, Pedrinho, Kbção e Carlito:




A Pedra Riscada vista de São José do Divino:



A estratégia inicial era sair na sexta a noite de BH, dormir duas ou 3 horas na base da Pedra Riscada, acordar cedo e escalar sábado as 9 ou 10 primeiras enfiadas, descer para dormir no plato que tem na altura da sexta parada, e escalar as 8 ou 9 enfiadas do final da via no domingo.
Mas sabíamos que ia ser muito difícil de chegar ao cume domingo a noite e descer até a base do paredão no mesmo dia. Por isso levamos água e comida para três dias.

Na base do paredão, a via de 850m e 18 enfiadas segue a aresta amarela entre sol e sombra:




Para carregar para cima os equipos levamos um grande barril: durante o primeiro dia o Pedrinho e Kbção ficaram por conta de puxar esse monstro de 50 kilos, quando o Alexis e Carlito estavam escalando rápido com pouco peso.



Ao inicio a estratégia deu muito certo, Pedrinho com sua grande experiência de trabalhos em altura conseguiu arrumar um jeito eficiente de puxar o barril com o Kbção, e eu e Carlito estávamos escalando rápido as primeira enfiadas fáceis. Carlito guiou as 4 primeiras enfiadas em 4to e 5to grau, guiei a quinta enfiada em sétimo grau, Carlito guiou a sexta e a sétima enfiada, uma linda fenda de sexto grau a proteger com móveis, e tudo se complicou quando chegamos a oitava cordada.

Carlito guiando a sétima enfiada:





A oitava cordada sobe uma fenda vertical, muito fina e difícil de proteger com móveis, em oitavo grau. Os conquistadores bateram uma primeira chapeleta a 3 metros da parada, uma segunda a dez metros: entre as duas chapeletas tem que se proteger com micro camalots e nuts (dois tipos de móveis).
Essa enfiada é o primeiro crux da via. Foi nessa enfiada que o Mister Bean caiu em Junho e quebrou o pé: ele vacou no crux da enfiada que fica logo abaixo da segunda chapeleta, as três proteções que ele tinha colocado saíram uma depois da outra e ele caiu até um pequeno plato abaixo da parada, gritando de dor...
Quando dessa vez comecei a escalar essa enfiada lembrava muito bem do Bean caindo, pois foi eu que estava dando segurança para ele em junho. Eu sabia que era quase o único lance difícil da via onde não pode cair de jeito nenhum, porque as proteções são ruins e, se elas estouram, o escalador cai num plato 10 metros mais baixo. Mas no mesmo tempo estava bastante confiante pois em junho tinha mandado o lance sem muito problema.
A diferença é que quando mandei o lance em junho eram 8 da manhã, a temperatura estava muito agradavel, e quando comecei a escalar sábado passado, era duas da tarde, no sol, a temperatura era muito quente. Depois da primeira chapeleta tive o prazer de achar um micro-nut travado na fenda que os Cariocas tinham deixado um mês atrás quando eles fizeram a primeira repetição da via. Depois do micro-nut coloquei mais 3 micro-camalots, para tentar proteger bem o crux abaixo da chapaleta. Mas eu sabia que essas proteções eram bastante precárias por causa da forma muito estreita e rasa da fenda. Entrei bem no crux, estava muito perto da chapeleta, escalando de oposição, com a metade da primeira falange dos dedos na fenda fina, quando de repente aconteceu o desastre... Minha mão direita, provavelmente por causa do calor, vazou... Comecei a cair para trás, estava a uns 9 metros acima do Carlito na parada, foi o inicio de uma longa vaca, o primeiro camalot saiu da fenda, comecei a dar um mortal!! O segundo móvel estourou também sem freiar minha queda, eu vi o ceu girando muito rápido, o terceiro camalot arrebentou do mesmo jeito, o pesadelo continuava, pensava muito forte que não queria machucar, o micro-nut saiu da fenda também sem opor nenhuma resistência, estava caindo, sempre caindo, passei do lado do Carlito igual um foguete, e finalmente cheguei sentado num plato a uns 2 metros abaixo do Carlos, de frente para o vazio!! Um segundo passou, dois segundos, e fiquei em pé, foi um milagre, não machuquei!! Incrível, amorteci a queda de 10 metros com minha bunda!!


A oitava enfiada vista de cima:


Não machuquei mas fiquei bastante chocado... Esperei meia hora e voltei a escalar a mesma enfiada, um pouco abalado, mas com outra estratégia em mente: ia tentar escalar esse crux em artificial. Não queria correr o risco de vacar de novo... Coloquei uma primeira proteção com um micro-camalot acima da primeira chapeleta, e dessa vez tive a ideia de descer até a chapeleta para testar o micro camalot: sentei na corda, mas segurando com as minhas mãos a costura da chapeleta. Sentei uma primeira vez, o micro camalot segurou meu peso, sentei uma segunda vez com mais vontade, o camalot segurou bem, sentei uma terceira vez fazendo mais força, e o camalot vazou... Nesse momento decidi desistir da empreitada, nenhum paredão vale a pena machucar e ficar parado vários meses...Cheguei a conclusão que para escalar essa enfiada com segurança precisava de um piton ou de uma outra chapeleta.
Eram 3 ou 4 horas da tarde, o cume nunca me pareceu tão longe que nessa hora. O Pedrinho e Kbção estavam chegando no plato que fica a direita da sexta parada onde a gente tinha planejado dormir. Foi nessa hora que o nosso anjo da guarda apareceu uma segunda vez: no plato, bem estreito, onde tinham duas pequenas árvores, aconteceu um segundo milagre: o Pedrinho e o Kbção acharam um galho bastante reto de uns 5 metros de comprimento!!

Na tarde do primeiro dia, no plato do bivaque, o Pedrinho e Kbção que puxaram 50 kilos para cima, desmaiam de cansaço...



O visual no final da tarde:


O nascer do sol no segundo dia:



Depois de uma primeira noite muito boa no plato, comecei de novo a escalar com o Carlito as 7 da manhã a oitava enfiada. Mas dessa vez, com um acessório bastante original : o galho de 5 metros, que eu ia usar de stick-clip !! A uns dois metros acima da primeira chapeleta, coloquei dois micro camalots, sentei neles delicadamente, puxei para cima o "galho-clip" com uma costura (e uma corda) colocada na ponta dele com esparadrapo, e depois de umas 10 tentativas, me esticando no máximo para cima, consegui costurar a segunda chapeleta!! UUHHUU!!! Soltei gritos de alegria!! De repente, a gente estava muito mais perto do cume!

O resto da enfiada é difícil, mas não existe mais risco de cair num plato, ela é bem vertical, subindo a mesma fenda, sempre muito fina.
Depois da oitava enfiada, guiei a nona enfiada. A primeira parte dessa enfiada é uma fenda mais larga, de sétimo grau, a segunda parta é negativa, de nono grau, escalei uma boa parte em artificial.

Escalando a nona enfiada:




Depois de escalar essas duas enfiadas já eram 11 da manhã, estava muito quente, era tarde demais para tentar chegar ao cume nesse segundo dia. O Kbção e Pedrinho falaram para nos descerem até o plato para descansar e esperar o calor baixar para continuar a escalar.

O Carlito na nona parada:


Por volta das 3 da tarde nesse segundo dia o Kbção e Pedrinho subiram jumareando até a nona parada, o ponto mais alto que tínhamos alcançado. Kbção guiou a décima cordada de oitavo grau, e começou a décima primeira enfiada quando a luz do sol começou a ficar laranja. Essa décima primeira cordada é o segundo crux e a enfiada mais linda da via: 60 metros de nono grau, com vários esticões de 8 a 10 metros!! Foi nessa enfiada que vaquei em junho de mais de 20 metros...

Kbção na décima primeira enfiada:


Nosso "destino" dependia agora do sucesso do Kbção nessa enfiada. Pedrinho estava na seg, eu e carlito estávamos deitados no plato, super atentos a qualquer movimento do Kbção, torcendo muito para ele conseguir chegar ao cume dessa enfiada. Foi uma luta que durou mais de uma hora e meia...


Cada vez que o Kbção chegava a uma chapeleta, ele gritava de alegria, como se cada chapeleta era uma conquista importante. Uma vez, segurando uma pinça muito ruim a 8 ou 9 metros acima da última chapeleta, ele quase vacou. Começou a expirar, estava no limite, e num movimento muito desesperado, ele superou a gravidade e alcançou a penúltima chapeleta da enfiada... Quinze minutos depois, quando ele alcançou a décima primeira parada, o pôr do sol atrás, foi festa na Pedra Riscada! Parabéns Kbção!!!


Na segunda noite no plato começamos a racionar a água. Separamos 8 litros para o terceiro dia, dois litros para o café da manhã, e 6 litros para o resto do dia, para 4 pessoas, era muito pouco...
Acordamos as 4 da manhã, jumareamos de noite as enfiadas que tínhamos subido o dia anterior, e o Kbção começou a guiar as 7 enfiadas que nos separavam do cume. O Pedrinho seguia depois do Kbção, jumareando ou escalando, e depois eu e Carlito formando outra dupla escalamos atrás deles.

Carlito jumareando:





Essas 7 enfiadas são todas lindas, numa aresta vertical que vira positiva no final, quase sempre muito exposta. Escalar a 700 ou 800 metros do chão é sempre um grande prazer para quem não tem medo de altura... Da a impressão de voar, de ter conseguido se livrar da gravidade... Dois maravilhosos e gigantes urubus rei nos acompanharam durante um bom tempo.



A meio dia alcançamos o cume!! É sempre um grande momento de alegria, o escalador é muito feliz de ter vencido a parte mais difícil da empreitada, mas não pode se relaxar porque ele ainda tem que enfrentar a parte mais perigosa da escalada: a descida.




Conseguimos ser bem eficientes na descida, Kbção e Pedrinho iam na frente, Pedrinho trocava uma chapeleta a cada parada para colocar uma argola e facilitar a descida de rappel.




Nesse terceiro dia, o vento nunca parou e incomodou bastante a gente na descida de rappel...




As 3 da tarde chegamos no plato do bivaque, depois de arrumar nossas coisas continuamos a descida e chegamos ao carro quando começou a escurecer, esfomeados e totalmente desidratados...
Timing perfeito!! Chegou finalmente a hora de relaxar...


ESCALAMOS A PAREDE DOS SONHOS!!
Essa via vai virar uma clássica com certeza, ela vale os big walls do Yosemite!!
Valeu Carlito, Kbção e Pedrinho, a parceria foi excelente!!
Essa semana, estamos muito felizes, realizamos um sonho, e mais importante ainda, temos muitos outros para realizar...

Apoiaram essa realização:
CONQUISTA, ADRENA, ROKAZ, AM420NIA E STONE

Escrito por: Alexis Loireau.